Hidrogênio gerando energia

Hidrogênio gerando energia

Hidrogênio e Tecnologias associadas

 

“Interessante notar que houve uma descarbonização progressiva das fontes primárias de energia“.                                  Marcelo Linardi.

 

As pesquisas sobre o hidrogênio não são novas. Era conhecido desde o século XVI e foi a partir da síntese da amônia (N2 + 3H2 = 2NH3) em 1913, passou a ser utilizado como gás de refrigeração e fertilizante. Passou pelas duas grandes guerras mundiais sendo estudado e veio a ter interesse industrial quando o gás natural (basicamente Metano = CH4) passou a ser explorado em larga escala, principalmente nas áreas petrolífera e siderúrgica como insumo químico.

O emprego energético do hidrogênio foi cogitado nos anos 1970 quando da primeira crise petrolífera mundial. O mundo começou a repensar sua matriz energética e a cogitar em alternativas para o petróleo. Dez anos depois, o petróleo baixou de preço e vimos um refrear das pesquisas. Como o mundo dá voltas, em 1991, o Encontro de Quioto exigia, agora por questões ambientais, que se buscasse combustíveis mais limpos para o mundo.

O hidrogênio parecia ser a melhor opção, já que é o gás mais abundante do universo, é insípido, inodoro, se vazar vai se misturar rapidamente na atmosfera, e sua combustão tem como subproduto a água. O hidrogênio ainda, pode ser produzido de várias formas e obtido a partir de várias matérias primas e em qualquer parte do planeta, sem riscos geopolíticos.

A ECONOMIA DO HIDROGENIO

Livro de Jeremy Rifkin – Recomendo a leitura

O combustível do futuro

Alguns autores consideram o hidrogênio como o combustível do futuro. Mas porque tendo tantas qualidades, ainda não estamos na Era do Hidrogênio? Que futuro é esse? Os autores atuais dizem que não foi preciso acabar com o carvão para entrarmos na Era do Petróleo e que nem precisaremos acabar com o petróleo para entrarmos na economia baseada no hidrogênio. O certo é que faltam algumas condições para que isso aconteça. Com as pesquisas, começaram a aparecer os gargalos tecnológicos, que vamos ver a seguir.

Características do Hidrogênio

Além das características já citadas, o hidrogênio possui a menor molécula de todas que conhecemos (84 g/m3), e assim, como poderemos armazená-lo? O hidrogênio sempre irá vazar, não há substância ou material que o segure confinado. As redes de gás natural não poderiam distribuí-lo pois não estão preparadas para isso, já que no caso do gás natural (GN) sua molécula está associada ao carbono e aí sim conseguimos uma logística menos dispendiosa.

O hidrogênio tem um poder energético muito grande, e isso o torna potencialmente perigoso. Em um ambiente confinado, em uma atmosfera, com apenas 4% (em volume) de hidrogênio existe perigo de explosão.

E tem mais uma coisa, o hidrogênio não existe de forma livre na natureza, deve-se ter um processo qualquer para obtê-lo ou separá-lo de seus compostos. Isso quer dizer que iremos gastar energia para depois utilizar o hidrogênio como vetor energético. Será que existe balanço positivo (ganho) nesse processo? Sim, mas isto pode custar muito caro.

 Fontes e tecnologias de obtenção do hidrogênio

Existem muitos processos físicos e químicos através dos quais o hidrogênio pode ser obtido diretamente ou como subproduto. Lembro ainda que existem processos tradicionais e consolidados em termos de tecnologia e outros ainda experimentais e em pesquisa de viabilidade.

O processo que vem sempre em nossa mente é o da eletrolise. A partir de uma fonte de energia externa na solução aquosa com eletrólito (meio condutor iônico), realiza-se a decomposição da água em hidrogênio e oxigênio. O consumo de energia desse processo é de 4,5 kW por Nm3/h de H2. As melhores opções neste caso é a eletrolise realizada a partir de energias renováveis (Green Hydrogen) como eólica, solar ou energia excedente das hidrelétricas.

Podemos obter o hidrogênio através da gaseificação de combustíveis fósseis (Black Hydrogen) e da biomassa renovável. O principal processo é a reforma a vapor (dos hidrocarbonetos fósseis) e dos gaseificadores de compostos orgânicos renováveis (madeira e resíduos agrícolas ou urbanos). Os gaseificadores trabalham à temperaturas elevadas (600-900 oC) exigindo gastos de energia para a produção de hidrogênio.

A indústria petrolífera e siderúrgica utilizam o hidrogênio em seus processos industriais e na produção de soda cáustica o subproduto hidrogênio poderia ser comercializado como insumo para outras empresas.

Vale a pena citar a produção do hidrogênio (experimentalmente) por meio das algas através dos processos de biofotólise e fermentação com ou sem presença de luz.

O Hidrogênio produzido pelos processos citados necessita de purificação, desumidificação e até de sofisticados processos de separação molecular para atender aos requisitos de pureza para ser utilizado nas células a combustível.

Armazenamento e transporte do Hidrogênio

O armazenamento do hidrogênio é um dos grandes desafios para consolidação de sua cadeia produtiva. A maioria do hidrogênio produzido no mundo é consumido quase que imediatamente por quem o produz, evitando desperdícios e por questões de segurança. Podemos armazená-lo na forma gasosa, líquida ou em compostos sólidos (hidretos metálicos) com vantagens e desvantagens inerentes a cada processo.

O hidrogênio possui baixa densidade energética (por unidade de volume) e baixo ponto de condensação (-240oC). A temperatura ambiente e pressão atmosférica, 1 Kg de H2 ocupa um volume expressivo de 11 m3 e poder calorífico de 34.500 Kcal/Kg contra 11.000 Kcal/Kg da gasolina em um volume bem menor, por exemplo. Para aumentar sua densidade, teremos que exercer um trabalho de compressão complexo e dispendioso.

O armazenamento do hidrogênio gasoso pode ser realizado através de gasômetros, cilindros pressurizados (150-200 atm) ou em depósitos subterrâneos. No estado líquido, somente em tanques especiais (criogênicos). Consequentemente, o transporte do hidrogênio, através de gasodutos ou em containers para fluidos criogênicos com a perda sistemática de gás devido à evaporação são tarefas difíceis de serem executadas, mas possíveis. Já existem alguns gasodutos de hidrogênio na Europa sobretudo como insumo às indústria siderúrgica regional.

A tecnologia de armazenamento através de hidretos metálicos (MxHy) possui uma relação peso/volume de H2 entre 2 a 18%. Para aplicações automotiva o mínimo seria de 6,5%. Os hidretos atuam como esponjas sofrendo a absorção e dissorção do hidrogênio.

Podemos ainda, armazenar e transportar o hidrogênio em compostos intermediários como a amônia, ácido fórmico (metanoico) ou em ciclohexano, necessitando de estações conversoras na produção e no consumo.

Aplicações energéticas do hidrogênio

Com tantos desafios, será que no futuro realmente estaremos vivendo uma nova economia baseada no hidrogênio? Possivelmente viveremos uma transição, uma descarbonização gradual da matriz energética, e temos tudo preparado para isto. O transporte espacial é realizado com hidrogênio no estado líquido, vários veículos automotivos já possuem sua versão exclusiva ou híbrida com hidrogênio e estradas e vias com infraestrutura baseada no hidrogênio.

A geração de eletricidade (energia elétrica) com a tecnologia das células a combustível (fuel-cells) podem alcançar uma eficiência global acima de 60% e se aproveitarmos a energia térmica inerente ao processo podemos chegar a 85% de eficiência, bem superiores às demais tecnologias de conversão disponíveis no momento.

Célula de Hidrogênio SOFC

Célula de Hidrogênio tipo SOFC – UNIFEI/MG (Crédito: O Autor)

Como dispositivos eletroquímicos, que convertem a energia química contida num combustível (hidrogênio) diretamente em energia elétrica, a célula a combustível é uma verdadeira pilha de funcionamento contínuo e produz energia elétrica sem a necessidade de combustão ou de partes móveis. A conversão resulta também na produção de calor que pode ser aproveitado para cogeração e o subproduto é a água. Portanto um processo silencioso, seguro e ambientalmente correto. Como inconvenientes estão os custos da tecnologia e a infraestrutura logística do combustível.

O hidrogênio no Brasil

Segundo documento do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, em Brasília/DF, no Brasil, cujos recursos naturais renováveis são abundantes e cuja matriz energética possui elevada participação de fontes energéticas renováveis, o desenvolvimento de tecnologias para a economia do hidrogênio certamente contribuirá para uma utilização mais eficiente dessas fontes energéticas, além de possibilitar uma participação importante no mercado mundial de equipamentos e serviços relacionados às energias renováveis e ao hidrogênio. Dessa forma, o engajamento do país na corrida para a implantação da economia do hidrogênio é altamente estratégico dos pontos de vista econômico, tecnológico e ambiental (CGEE, 2010).

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Célula de Hidrogênio tipo PEM 1 KW- CEMIG/MG (Crédito: O Autor)

Programas nacionais como (PROCaC ou PROH2) foram desenvolvidos para consolidar as competências e tecnologias nacionais que envolvem a economia do hidrogênio, salvaguardando a propriedade intelectual em todo desenvolvimento tecnológico e de inovação envolvidos. As rotas tecnológicas envolvem as células a combustível estacionárias (Geração Distribuída), obtenção do hidrogênio através da reforma do Etanol, células do tipo PEMFC e SOFC, sistemas a CaC, entre outras.

Certamente veremos nos próximos anos, projetos de demonstração de todas as tecnologias e produtos/sistemas gerados pelos programas governamentais em curso. Esses projetos devem determinar viabilidades técnico econômicas nos mercados de energia e gerar dados de confiabilidade para futuras ações comercias.

Concluindo, o hidrogênio é um vetor energético que vem se tornando objeto de pesquisa em todo o mundo e o país não pode ficar como mero espectador ou importador dessa tecnologia. O papel governamental através de seus mecanismos de incentivo à pesquisa e desenvolvimento (P&D) é fundamental.

 

Referências

 

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